Branca de Neve em 2009

Era uma vez uma menina chamada Branca de Neve. Ela morava com o pai no Brooklyn, em Nova Iorque, e havia perdido a mãe há algum tempo.
Depois de um tempo seu pai casou-se com uma coroa malvada, que tinha lá seus quase sessenta anos e ainda jurava que era linda. Gastara fortunas com botox, prótese de silicone, abdominoplastia. Tinha personal trainer, um lábio inchado de colágeno e usava roupa de lycra. A madrasta queria ser a mais bela de todo o bairro.
Um dia a madrasta perguntou para o personal trainer quem em todo o bairro era mais bela que ela. E no fundo ela sabia que a resposta seria Branca, porque sempre teve inveja de sua pele perfeitamente alva, seus cabelos negros e olhos azuis da cor do Pacífico. Pois dito e feito, o personal respondeu “Branca de Neve” e foi demitido.
A madrasta malvada resolveu se livrar da menina contratando um matador de aluguel jamaicano. Negro, alto, forte, bonito. Quando viu Branca de Neve se encantou pela moça e não teve coragem de matá-la. Tomaram um drink no Soho e ele pediu pra Branca fugir de Manhatan.
Branca de Neve foi morar no Bronx, dividindo um apartamento com sete baixinhos mexicanos, todos imigrantes ilegais.
Um dia os baixinhos mexicanos receberam uma encomenda. Uma caixa de doughnuts com geléia endereçada à Branca de Neve. Depois de um longo dia de trabalho na recepção de hotel três estrelas, Branca chegou em casa e agradeceu aos céus por ter doughnuts, afinal, estava de TPM. Devorou um por um e adormeceu num sono profundo.
Os mexicanos chegaram do turno do Mc Donald´s tarde da noite e encontraram Branca deitada no chão.
Que pasa, Blanca?
Me parto el culo trabajando y ella se emborracha solo…
Blanca, acuerda! Blanca! Que pasa, Manolo?
Mierda de puta madre!!!! No tiene pulso!
Um dos mexicanos chamou o vizinho, Prince, um porto riquenho lindo de morrer. Alto, moreno, forte, olhos verdes, cheiroso. Manolo disse:
Besa a la chica, Prince! Besa a la chica!
Aunque se estuviese MUER-TA, Manolo! No me gusta la fruta, caramba!
Branca de Neve foi levada para a emergência e não resistiu…

PS: Já peço desculpas se tirei todo o encanto de um conto de fadas… foi só um surto momentâneo!!

Sonho proibido

Estava tendo um sonho proibido. Tão proibido que a vizinha de baixo começou a gritar “Polícia” três vezes em espanhol. O grito fez parte do sonho por alguns segundos, depois cumpriu seu papel e me acordou. Policiando os sonhos proibidos.

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A vida, por Emília

Eu tinha talvez uns nove anos de idade quando minha tia chegou com uma caixa de papelão enorme e disse:
– Toma. Eu sei que você é a única que gosta de ler…
E quando eu abri, a caixa tinha a coleção completa do Monteiro Lobato, em capa dura. “Reinações de Narizinho”, “Memórias de Emília e Peter Pan”, “A chave do tamanho” e mais um monte. Foram boa companhia por muito tempo.
E morro de remorso quando penso que não tenho mais coisas como essas, que fizeram parte da minha infância. Queria ter guardado meus bonecos do Cascatinha e do Fofão. Seriam ícones hoje. Queria ter guardado essa coleção e a minha caixa de gibis de capa dura da Mônica. A minha bebezinho, que teve história pra contar... O que me conforma é que sei que todos os meus livros sempre foram doados pela minha mãe para instituições de caridade. E não há nada de mais perfeito nesse mundo do que passar magia de mão em mão.
Deixo aqui um trecho de “Memórias de Emília”, que achei no blog da Rah.

criança-lendo

“– A vida, senhor Visconde, é um pisca-pisca. A gente nasce, isto é, começa a piscar. Quem pára de piscar chegou ao fim, morreu. Piscar é abrir e fechar os olhos – viver é isso. É um dorme e acorda, dorme e acorda, até que dorme e não acorda mais […] A vida das gentes neste mundo, senhor Sabugo, é isso. Um rosário de piscados. Cada pisco é um dia. Pisca e mama, pisca e brinca, pisca e estuda, pisca e ama, pisca e cria filhos, pisca e geme os reumatismos, e por fim pisca pela última vez e morre. – E depois que morre?, perguntou o Visconde. – Depois que morre, vira hipótese. É ou não é?”

Cidade maravilhosa

Vocês sabem que se me der um louco eu faço dois, né. Pois então. Ontem à noite saí da academia (ainda estava claro), depois de uma aula de pilates e outra de spinning. Andava com a minha amiga na avenida da faculdade quando nos aproximamos desse casal perdido no meio da rua. Uma mulher de uns cinquenta e poucos anos e um senhorzinho muito fofo. Vira a mulher pra gente e diz alguma coisa sobre tennis. A gente achou que eles queriam jogar tênis, mas aí eles começaram a falar os dois ao mesmo tempo e eu ouvi um “pelota” no meio. Soltei meu portunhol e perguntei se eles falavam espanhol. A mulher se empolgou toda e perguntou se eu era espanhola, eu disse que não, que era Brasileira. Descobri que eles queriam era jogar squash, que é na academia. Dei as instruções enquanto o senhorzinho tentava persistentemente falar comigo em espanhol. Quando dei brecha ele me perguntou de onde eu era e eu disse São Paulo. Aí ele desembestou a falar que já tinha ido pro Rio, pra São Paulo, pra Curitiba e pra Foz do Iguaçu, que amava o Brasil e tralalá.
E quando eu me dei conta estavamos eu e ele cantando “Cidade maravilhosa” bem alto, com os braços abertos e espalhafatosos no meio da avenida. Só percebi o mico quando a mulher começou a puxar o pai e dizer  “gracias, gracias, gracias”. E ele foi embora de costas, cantando com os braços abertos e eu também, nos separando minuto a minuto. Cena de filme. Minha amiga polonesa tava sentada no ponto de ônibus se matando de rir.

Ô dificuldade…

Como é difícil expressar uma opinião num blog sem receber trocentos neguinhos mal educados falando a respeito.
O povo joga “Sandy” nos motores de busca e cai aqui matando. Gente, vai escrever pro fã clube, me deixa aqui com o meu barraco. Blog é uma expressão pessoal, não é casa da mãe Joana. É público até onde eu quiser que seja. A casa é minha, quem manda aqui sou eu. Caramba… será que é tão difícil criticar com educação nos dias de hoje?

Descabimento perfeito

Depois de uma briguinha descabida e um monte de palavras puramente hormonais, nada melhor do que terminar a noite dormindo de conchinha.
E ainda acordar com  uma mensagem no celular “i´m so lucky to have you in my life, i love you so much”. É um descabimento tão descabido que chega a ser perfeito.

E pra quem tem cobertor de orelha, experimente um pouco de Paolo Nutini. É viciante.

“Para sempre é muito tempo”

A maioria de vocês conhece minha paixão por Vinicius, Pessoa, Drummond, Machado e Clarice. Hoje coloco outro nome neste círculo: Mário Quintana.
Deixo algumas frases sensacionais deste velho poeta brasileiro, gaúcho, cheio de simplicidade, ironia e genialidade.

“A alma é essa coisa que nos pergunta se a alma existe.”

“A preguiça é a mãe do progresso. Se o homem não tivesse preguiça de caminhar, não teria inventado a roda.”

“Não me ajeito com os padres, os críticos e os canudinhos de refresco: não há nada que substitua o sabor da comunicação direta.”

“Sonhar é acordar-se para dentro.”

“Um bom poema é aquele que nos dá a impressão de que está lendo a gente … e não a gente a ele!”

“A maior dor do vento é não ser colorido.”

“Bendito quem inventou o belo truque do calendário, pois o bom da segunda-feira, do dia 1º do mês e de cada ano novo é que nos dão a impressão de que a vida não continua, mas apenas recomeça…”

“Há noites que eu não posso dormir de remorso por tudo o que eu deixei de cometer.”

É incrível como um instante único, uma pequena leitura e alguma junção de palavras podem mudar completamente um dia. Uma visão nova, um mundo novo. Palavras velhas para um novo dia. Poetas velhos para uma nova vida.

Em tempos de crise…

Todo mundo sabe que a Inglaterra está passando por uma crise brava desde o ano passado. Muita coisa mudou por aqui. O índice de desemprego atualmente é monstruoso, a inflação continua e tudo parece ainda não ter voltado ao normal.
Em uma fase como essa, Brasileiro sempre tem que dar o seu “jeitinho”. Afinal, quem melhor do que a gente para ensinar esse bando de “desenvolvido” como enfrentar uma crise?
Desde que eu saí do Hotel a situação em casa não tem sido lá muito fácil. E eu percebi que aos poucos estou me tornando uma vegetariana quase que por determinação financeira. Carne aqui é cara, como em qualquer outro lugar do mundo. Algumas coisas podem ser baratas, mas considere um país onde a beringela, umazinha só, custa uma libra. Não dá pra sair gastando as douradinhas assim do nada.
Então eu tenho encontrado alternativas entre proteína vegetal e a famosa combinação de aminoácidos: arroz e feijão. Ou arroz e ervilha, ou arroz e lentilha. Sementes e oleaginosas também. Minha despensa agora tem broto de alfafa, quinua, grãos, cereais, soja e sementes. E no freezer apenas uns fishcakes para o marido, um filé ou outro de peixe, e o que a gente encontrar de razoavelmente barato. Filé de peru por exemplo. Mais barato que frango.
Ultimamente minhas visitas ao supermercado se concentram na sessão “reduced”. E não, não me sinto pobre por isso não. Afinal de contas, o que está em liquidação é o que teoricamente irá vencer no dia ou no dia seguinte. Se eu puder cozinhá-lo até o dia seguinte, ótimo. Ou congelo e pago mais do que 70% a menos.
Aqui na Inglaterra tem uma coisa muito engraçada que é a data de validade em frutas e legumes. Ora, desde que me conheço por gente uma fruta só estraga quando estraga. Não tem data pra expirar. E ainda se ficar ruinzinha de um lado, a gente corta fora e come o outro lado. Nunca na minha vida vi data de validade em maçã, banana, uva. Por isso tenho economizado muito com frutas essas semanas. Compro as da sessão “reduced”, que aparentemente estão perfeitas, e consumo até elas me contarem quando não prestam mais. Por exemplo, outro dia comprei uma caixa de uvas reduzida de duas libras pra cinquenta centavos. Porque a data dizia que venceria naquele dia. Os cachos duraram mais de uma semana na minha geladeira, por cinquenta centavos! E nessa onda tenho consumido muito mais frutas!
E também tenho dado mais atenção aos produtos de estação, o que diminui o meu “carbon footprint”, ou seja, a minha participação na poluição do mundo, já que o que não é da estação é importado e vem pra cá através de avião ou navio.
Todos os supermercados tem uma linha mais barata pra tudo, inclusive carnes, peixes e frango. Mas eu sou ecochata demais. Se tiver que comprar ovos de frangos que vivem engaiolados, eu prefiro não comprar. Se for pra comprar carne desses frangos, cheios de hormônio e sem espaço nem pra abrirem as asinhas, não compro. Dou preferência ao que é orgânico ou ecologicamente correto. Por isso prefiro usar as alternativas vegetais no momento.
Eu não conseguiria ser vegetariana pra sempre, porque amo um peixe e -principalmente – um bom churrasco. Mas carnes não são as únicas fontes de proteína.
Outra coisa que a gente fez foi cortar o telefone de casa e pegar um celular em pós pago, só um deles. A gente usa os meus minutos inclusos para ligar pra quem quer que seja no Reino Unido e não paga mais a assinatura e o monte de abobrinha que vem com uma conta da BT (que quis me cobrar 500 libras da última vez). O David continua com o pré pago e não gasta quase nada, já que usa o meu pra telefonar e eu ligo do meu pra ele sempre, porque é de graça. Internet agora só com o dongle, que é no esquema TopUp (se bem que ainda acho que vale a pena o pacote básico da Sky – se não usar o telefone!)
Também comprei um chip (sim card) na 99p Shop por – óbvio, 99 centavos – da TalkTalk. Acho que chama TalkTalk World, é um plano que dá ligações mais baratas internacionais, eu não tenho gastado quase nada com ligações pro Brasil! Faz um mês que eu tenho e ainda tô no crédito de 10 pounds, ligando pra minha mãe todos os dias!! É absurdamente barato.
Bom, ficam aí as dicas pra quem está morando na Europa e enfrentando essa crise, que dizem melhorar no ano que vem. Aí a gente comemora com um filé mignon!

Muita gente me fala “ah, eu tirei o passaporte italiano, tô pensando em ir pra Europa passar um tempo”. Gente, se não tiver que vir, não venha. Pelo menos por enquanto. A situação aqui não tá nem um pouco mais fácil do que no Brasil, conheço gente em vários países europeus que não encontram emprego há meses. Se não falar a língua fluentemente então, fique onde está. Não há vagas. Os poloneses pegaram todas as vagas em que não é preciso o uso do idioma, então, don´t bother. Tirem da cabeça essa idéia de vir pra Europa fazer dinheiro porque as coisas não são bem por aí. O custo de vida aqui é alto, e você provavelmente não vai conseguir juntar muita grana se vier para um sub-emprego. Sabe aquela estória do “melhor um passarinho na mão do que dois voando”? Fiquem no Brasil, pelo menos por enquanto. Conselho de amiga.

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