Ilusão é um veneno saboreado aos poucos

Ilusão é um veneno saboreado aos poucos. Insípido, amarga a boca apenas quando engolido aos grandes goles. Mas quem se ilude, geralmente se ilude em gotas.
O iludido é um colecionador – de frases soltas, de clichês baratos, de memórias e cenários inventados. Não perde um caco de provável sentimento alheio derramado ao chão e, a cada caco, concebe um valor que ele mesmo criou. A cada caco, uma gota do próprio veneno. 
Ilusões são enganosas, profundas e doem toda a dor do mundo. E até mesmo a ilusão mais antiga, quando volta, coça feito cicatriz velha. As gotas de ilusão não doem enquanto não existir clareza, mas quando se abre os olhos, elas cegam. É o grande gole amargo. 
Quiçá um dia o iludido aprenda que ilusão nada mais é do que expectativa e que todo sentimento não correspondido é uma facada no meio das costelas. E que consiga sempre viver de olhos abertos, longe das gotas que amortecem a língua e o cérebro. Que proteja sempre seu coração dos sorrisos mal intencionados mas que nunca o feche demais para os que lhe querem bem.

Desfecho

Tenho mania de desfechos, de começo-meio-fim. Tenho mania de me despedir e de dizer que amo como se fosse boa noite.
Costumava achar que essas manias estavam relacionadas ao fato de contar estórias, inventar enredos. Mas não. Minha mania de desfecho tem a ver com perdas.
Perdi pessoas e seus últimos suspiros. Não as vi indo embora, não previ partidas a tempo. Perdi o último adeus, perdi a última despedida, perdi o eu te amo engasgado em mim para sempre. A única coisa que disse é que eu voltaria amanhã; e o amanhã foi muito tarde.
Tenho pavor de que alguém vá embora sem saber o quanto é amado por mim. Tenho receio da dúvida, do coração angustiado sem entender claramente o significado de sua existência na minha vida. Tenho medo de que nunca saibam o quanto me mudaram, o quanto me inspiraram, o quanto me lapidaram com seus impactos.
Procuro sempre deixar um pedaço de mim em palavras, afinal, é o que de melhor tenho para oferecer. Então não se assuste se eu disser que amo cedo demais, se eu vomitar em versos tudo o que sinto, não se preocupe se eu for sempre tão coração, não me ache esquisita por nunca deixar conversas em aberto.
Eu aprendi na marra que é preciso deixar que a vida corra em seu ritmo. Eu não tenho expectativa nenhuma quando eu me despeço de alguém, nem ao menos espero que retribuam meu amor, que jorra líquido pelos meus poros. Mas, por favor, permita-me transbordar por todos os meus inteiros. Eu nunca soube aprisionar amores.
E gostaria muito que soubesse todas
as noites, quando coloca a cabeça no travesseiro, que meu amor está sempre contigo, todos os dias, até o nosso último adeus.