Morar em outro país é estar constantemente sozinho

Um dia talvez você pense em largar tudo e morar fora, e se existe um conselho que eu possa te dar, aprenda a ser tua melhor companhia.
Morar em outro país é estar constantemente sozinho. É estar sempre acompanhado por pessoas que talvez até tenham algum carinho por você, mas que dificilmente estariam ao teu lado se precisasse. Morar fora é saber viver – bem e feliz – com teus próprios pensamentos, essas vozes dentro da tua cabeça, esse turbilhão de emoções que você, como um bom brasileiro, guarda aí dentro.
A não ser que você more em um país latino, talvez as tuas experiências sejam as mesmas que as minhas aqui. A não ser que você tenha amigos brasileiros, talvez você perca um pouco o sentido de amizade. O frio do norte não enrijece apenas os ossos.
Os ingleses geralmente são calorosos, mas existe um detalhe essencial na construção de uma base sólida de amizade: a entrega. Ingleses são fechados emocionalmente e dificilmente se abrem ou se entregam para você. Aquele sentido de amizade que você tem, aquela amizade brasileira, de contar de olhos fechados, de poder ser inteiramente você, isso é muito raro por aqui. É difícil construir afinidade com quem não se permite, então suas amizades talvez sejam sempre superficiais. Sempre.
Obviamente você encontrará raras exceções. Eu, por exemplo, as encontro nos europeus do leste, um pouco mais parecidos com a gente. Mas, ainda assim, existe algo na Europa que endurece um pouco as pessoas por dentro. Existe algo por aqui que não permite que relações humanas sejam aprofundadas. Talvez sejam os milhares de anos de pé atrás, as inúmeras guerras, esse espírito de batalha que – quiçá – não permita que o toque vá além da ponta de uma espada. 
Não espere ver famílias se beijando, se abraçando, como estamos acostumados. Espere apenas apertos de mão, um sorriso quente, uma palavra solta sem qualquer intenção de “vamos marcar”. Não espere gente festiva no dia do seu aniversário, nem telefonemas. Não espere abraços, muito menos os verdadeiros. Espere sempre um cartão, sem nada escrito, já que a frase impressa diz o que queriam dizer, e apenas um “love, fulano” no canto direito. E “love” dependerá demais do grau de amizade que você terá com essa pessoa.
E, por favor, não me entenda mal. Eles não são ruins, muito menos têm culpa. Eu precisei de um abraço há algumas semanas e é nítido o quanto eles não sabem como reagir. Eles te olham tristes, sabendo que precisa de algo, mas não têm ideia de por onde começar. Então permanecem ali, estáticos à sua frente, imobilizados pelo inverno constante no sangue, com olhos grandes de compaixão. Eu não ganhei o abraço que precisava, mas recebi uma mensagem de texto depois dizendo “sinto muito, eu deveria ter te abraçado, mas eu não sei lidar com essas coisas”. Eles nunca aprenderam, eles nunca foram ensinados.
Então, reafirmo meu conselho. Se um dia quiser morar na Europa, aprenda a ser sozinho. Solidão será sua melhor companhia, ainda que esteja no meio milhares de pessoas. Aprenda a organizar essas conversas dentro da tua cabeça, a dar risada consigo mesmo, aprenda a não enlouquecer com você mesmo. Aprenda a viver com um pouco de frieza, mas não se deixe endurecer – não vale a pena. Escolha alguém para quem você possa ensinar um pouco de calor humano. E se nada disso der certo, arrume um bicho. Bichos dão carinho e abraços incondicionais.