Retrospectiva

Quando eu era pequena queria ser escritora, desenhista e arqueologista. Nessa mesma ordem. Escritora e desenhista era porque eu simplesmente adorava os dois. Arqueóloga era culpa do Indiana Jones, meu ídolo infantil. Depois eu cresci (só um pouquinho) e quis ser bióloga ou publicitária.
Chegou o vestibular e minha família caiu matando. Filha de advogado, escrevendo bem desse jeito??? Bióloga???? Pra estudar drosófila?? Não, mãe, pode ser bióloga marinha! Pra estudar crill???? Então publicitária. Menina, você já viu quantos concorrentes por vaga tem na Fuvest pra Publicidade? É mais que Medicina!!!!
E eu me lembro muito bem: eram 122 concorrentes por vaga. Era óbvio que eu não entraria na USP, meu lado humanas jamais salvaria meu zero a esquerda em exatas. Podia ser tudo dez em História, Geografia, Português, Biologia, Conhecimentos Gerais. Mas com zero em Física, Matemática e Química, meu vestibular ficaria medíocre, mediano. Eu até prestei Fuvest mas nem passei pra segunda fase. E a família caiu matando de novo, tinha que ser universidade pública!!!
Eu queria entrar na Faap, minha mãe fez Faap, meu primo fazia, e a faculdade era linda, as pessoas eram lindas, era tudo lindo. Prestei ESPM, fui super bem. Mas fiquei em terceiro na lista de espera e nunca fui chamada…
Sobrou a única… Fundação… FAAP e suas escadarias, a ótima reputação em Publicidade, e uma Publicidade mais Propaganda do que Marketing, afinal, eu já tinha tudo planejado: Redação Publicitária.
Passei na Faap e foi incrível. Os melhores quatro anos da minha vida, eu amava cada aula, cada intervalo, cada cervejada, cada noite no bar, cada um dos meus amigos, cada JUCA, cada menino que passava na minha frente. Eu amava tudo, trabalhava de graça.
Trabalhei numa agência bam-bam-bam que não me pagava um puto e tirava meu couro. Odiei agência. Procurei emprego em redação por um ano, ouvia sempre a mesma coisa “seu portifólio é ótimo, mas…”: Sempre tinha um “mas”.
Até que fui parar no último lugar que imaginei na vida: na empresa de moda do meu tio. Em assessoria de imprensa.
E eu, que nunca quis ser cliente, nuca quis ser marketing, fui me arrastando aos pouquinhos pro marketing. E assim foi por oito anos, marketing de moda.
E com 28 anos de idade, quando se acha que deveria estar pelo menos se estabilizando em alguma coisa, cá estou eu. Como recepcionista de Hotel. São Judas Tadeu, dá pra dar uma mãozinha, por favor?????

 

 

PS: E aguardem! A velha “Retrospectiva 2008”, copiada das minhas agendas de 1995, quando eu tinha 15 anos, virá em breve!!!!

Gente estúpida

Trabalhei o fim de semana inteiro. Ontem tive late shift, das 15 às 23, e hoje lá estava eu no hotel às 6:30 da manhã. Desumano.
Semana passada tive uma crise de tpm com a minha supervisora, ela é grossa, mal humorada e resolveu me ignorar. Eu, de tpm, sensível pra caramba, sentindo falta da minha família, ouvi umas patadas dela e entrei no carro do marido chorando. De raiva mesmo.
Ô menininha mal amada!!!! Ela tem 24 anos, por isso me deve respeito (hohohoh) e se acha a rainha da cocada preta. Como diria um espanhol lá na Bélgica, grande mierda de puta madre. A coitada é recepcionista há cinco anos lá dentro, nunca vai ser mais nada da vida, pelo jeito, eu tenho mais é que ter dó dela.
Hoje, já recuperada da síndrome chora-com-propaganda-de-sabão-em-pó, troquei de shift com ela. Fiz de manhã, ela chegou à tarde. Quando fui passar o handover pra ela (coisas que tem pendente para o outro turno), ela não olhava na minha cara e só respondia uns mhumm, mhummm, mhummm. Eu falei, falei, falei, virei as costas e fui embora. Ela, como sempre, não olhou nos meus olhos e não disse tchau.
Eu cheguei no carro hoje e disse pro David: “no Brasil isso só tem um nome: falta de sexo”. Pede pro namorado fazer direito querida, você vai ver só, o humor muda, a pele fica um luxo! Ah, give me a break! Gentalha, gentalha, gentalha!!!!

Velha

Fui pro treino de personal. Olha que orgulho, chuva, escuro, seis graus, e eu de guarda chuva, casaco e legging a caminho da academia.
O meu medo da Lu tinha total fundamento, nem colocar a mãozinha na esteira eu pude!!! Hands off, darling, hands off!!!!!!! Tipo, army mesmo!
Mas foi bom, no fundo, no fundo eu adorooooo… adoro suar, sentir meus músculos tremendo!!! Tá, você deve achar que sou louca, mas de repente eu sou mesmo.
Só teve um porém que me fez sair de lá completamente chocada. A maldita balança de bioimpedância…. Eu já não queria me pesar, porque tô de chico, aí vai ainda numa de bioimpedância…. Beleza, uns vários porcentos de gordura, uns normais de massa magra, uma parte de desidratação. Juntando tudo isso, a balança me dá a tal da minha IDADE metabólica. Eu quis morrer de catapora. 43 anos!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
Desculpem-me mas entrei em depressão.

Para inglês ver

Sabe, o inglês é um povo esquisito. Consegue se extremamente caloroso e extremamente frio num curto espaço de tempo de dois minutos.
Digo que quando se conhece um inglês, ele é bem brasileiro. Fala alto, dá risada, brinca. Quando não se conhece, é o perfeito finlandês. Se bem que já conheci finlandeses nada frios. Mas o inglês pode ser frio, e muito.
É do tipo que anda na rua olhando sabe-se lá o que. Não é difícil saber quando alguém não é inglês aqui, é só ver se o cidadão vai olhar pra você. Andar nas ruas da Inglaterra, entre ingleses, é sentir o pózinho mágico da invisibilidade na pele. E se ele encostar a aura na sua, ele pede desculpas, mas não olha nos seus olhos.
O inglês é infinitamente mais educado que o francês, embora minha última experiência em Paris, há algumas semanas, tenha mostrado um povo quase que educado. Grosseria mesmo é na Bélgica, mas não estou aqui pra falar dos Belgas. Voltemos aos ingleses.
Pois bem. Os ingleses geralmente tem vários metros de altura, inclusive as mulheres. Ou eu é que sou pequena demais. Os homens, geralmente, são esquisitos e as mulheres, a maioria, é bonita demais. Mas são todas absolutamente iguais. Eu acho que inglês se subdivide em dois: os feios com cara de Hooligans, e os bonitos, impecavelmente bonitos. Quando inglês dá pra ser bonito é de tirar o fôlego, mas quando dá pra ser feio também é de dar dó.
Londres é um caso a parte do interior, as pessoas costumam ser mais bonitas, mais bem apresentadas. No interior, as mulheres costumam ser gordas, narigudas, e de cabelos ralos e criteriosamente oleosos e sujos. Andam de conjunto de moletom, o que nada favorece. A vaidade passa longe do inglês caipira, mesmo sendo um caipira de cidade nem tão pequena.
O homem da subdivisão feia tem cara de irlandês feio: bochechas protuberantes, narizes e orelhas grandes e vermelhas. Têm dois metros de altura e parecem o gigante do João do pé de feijão. E alguns ainda nem dentes têm, o que deixa a imaginação infantil ir ainda mais além.
Agora quando são bonitos, da outra subdivisão, são lindos. Podem ser loiros ou morenos, ainda com os dois metros de altura, com olhos de cores que nunca há de se imaginar, como o do meu inglês: cinza. Tem narizes perfeitos, dentes bonitos, e um charme que há de se ver para crer.
As mulheres quando dão pra ser bonitas, o que inclui a maioria das teenagers, são lindas. Tem caras de boneca, rostos redondos, pele extremamente perfeita, bochechas rosadas. Narizes que há de se chegar perto pra checar se são de verdade, de tão pequenos. Olhos infinitamente coloridos, grandes, cílios, boca carnuda ou pequenininha. Parecem bonecas andando em corpinhos de cachorro, finos e esquios. Mas todas iguais. A mesma maquiagem, o mesmo cabelo, a mesma calça skinny e a mesma bota peluda. Você dobra a esquina e jura ter visto a menina na esquina anterior!
Quanto a civilidade e a pontualidade, não vejo mais tanta coisa diferente. O inglês cospe na rua, joga lixo no chão, não dá lugar para os velhinhos e a pontualidade é algo que se aplica só no local de trabalho. Mas obviamente existem as excessões. Outro dia desses vi uma menina de uns dezessete anos passeando com a avó no shopping. Foi uma cena rara, uma adolescente de braços dados com uma idosa. A menina linda, boneca, com um vestido lindo. A vovó fofa, cabelinhos penteados, brincos, batom. A mesma vaidade, mas uma cena extremamente rara, visto que os ingleses são muito independentes. Inclusive os idosos.
O inglês é egocêntrico, é cobra muito mais criada do que brasileiro. Inglês não abaixa, não. Nós é que temos a mania de submissão. Inglês veste o humor que quiser e você que se vire se não te der bom dia. Ele não vai mudar o humor dele para te agradar. E também não vai deixar ninguém mudar o humor dele quando for a situação oposta.
Eu aprendi. Ao invés de dar oi e tchau no trabalho, eu espero. E se não ouvir resposta, não é o fim do mundo, e eles não estão me ignorando. E mesmo que ignorem, há sempre o por favor e o obrigado. Pra fingir que não há grosseria.
Agora quanto ao humor. Pode parecer louco, mas só eles se entendem. Demora para pegar o humor inglês. Eles adoram tirar sarro, são sarcásticos, e se te pegarem pra Cristo um dia inteirinho, era só de brincadeira. Quanto mais conseguirem te irritar, mais engraçado fica.
O inglês têm umas coisas engraçadas, como a mania por gestos de caridade, o vício em programas de sitcom e calouros, e a amada novela que tem vinte anos, Eastenders. Não conheço um cidadão do mundo que consiga assistir à essa novela, a não ser o inglês. É a própria tortura medieval. E eles ainda relutam dizendo “ah, mas olha que legal, essa mulher aí começou a fazer Eastenders quando tinha cinco anos!”. E qual a graça disso? Uma novela que não acaba nunca??? O pior é que Eastenders sempre ganha o prêmio de programa de TV do ano, há décadas. Qual é a graça de saber o resultado do prêmio?
Isso te explica o que é a televisão aqui. Nada de interessante, nunca. Em casa ou a gente assiste Friends, ou videoclips. De vez em nunca na semana tem uns programas humorísticos que valem a pena… o resto e a BBC inteira pode virar pó.
E você sabe porque a BBC é a maior rede do mundo? Porque aqui a televisão não é gratuita. Se paga cento e trinta e nove libras por ano para ter acesso aos canais “livres”, como BBC1, BBC2, BBC3 3 BBC4. E é esse o dinheiro que banca a rede mais rica do mundo. Se você pegar o sinal e não pagar, vai preso. Tudo em nome da BBC.
Mas o inglês é gente boa. Há de se mastigar por muito tempo para engoli-lo, mas um dia a gente se acostuma. Na vida a gente se acostuma a tudo. E vira e mexe você acha um com alma latina, mesmo que os últimos dois mil anos de antepassados tenham sido da ilha, mesmo que o sobrenome tenha brasão e tudo…. inglês com jeito de brasileiro, como o meu inglês, por exemplo.

Desafio

Tá chovendo, o dia tá cinza, a sensação térmica é de 5 graus e eu marquei minha primeira aula de personal às 16hs….
Ai….

Quem sou eu?

Quem sou eu. O orkut há tempos me pergunta isso e eu venho enrolando com versinhos de uns aqui, com letras de músice de outros ali. Então vamos ao que interessa.
Se você me vir de longe eu sou aquela baixinha lá no meio da multidão. Baixinha sim, feliz com isso também não, mas conformada e esperançosa de ainda inventarem uma máquina de esticar tipo Homem-Borracha. Como diz o David quando não consigo alcançar alguma coisa na prateleira “e não consegue porque?”, e ele só sossega quando eu afirmo contra meus próprios nervos “because i´m little”. Little que não passa dos 1,57, dependendo da fita métrica ou da balança.
Sou aquela que ri alto e não tem vergonha de dar gargalhadas que, segundo a minha irmã, exigem muita cautela pois possuem pausas respiratórias frenéticas. Sou a que está sempre contando um causo, uma estória, alguma esquisitice que, em sua maioria, tiveram eu mesma como personagem. E as pessoas não acreditam, ou acreditam se me conhecem, e bem, e sabem que existem coisas que só acontecem comigo.
Eu queria ter cabelos lisos e escorridos às vezes, mas amo meus cachos, às vezes também. Assumi com orgulho a cor natural do meu cabelo que me surpreendeu com  um castanho avermelhado que só Deus sabe de onde vem (e eu não via desde os doze anos).
Cresci com uma mãe ao quadrado, que deu a vida por nós, e um monte de gente cuidando de mim. E esse monte de gente, que geralmente aparece, mete o bedelho, palpita e dá conselho é chamado de família. Família que chora quando eu vou embora, que está sempre presente em qualquer lugar do mundo. Minha amada família que eu amo mais que tudo nesse mundo.
E meus amigos! Ah, meus amigos, essa família que a gente escolhe e que preenche o coração! Sempre presentes, mesmo longe… mas que fazem tanta falta no meu cotidiano!
Um dia eu resolvi ter um cachorro e procurei muito antes de comprar. Me apaixonei por um poodle de 11 meses e acabei desistindo porque fui visitar a minha amiga, Gá. Eu tinha dezessete anos e a cachorra dela tinha dado cria. Quando entrei num banheiro onde estavam os dois filhotes, do tamanho da palma da minha mão, o machinho veio se rastejando na minha direção e subiu no meu tênis. Eu o peguei no colo, ele grudou as garrinhas na minha blusa, e assim tem sido por quase doze anos. Meu amado filhote, a coisa mais linda da minha vida, Billy the Kid. O poodle mais lindo do mundo.
E por todo esse amor, dói demais no coração saber que estou longe e lembrar do calorzinho dele quando deitava na minha barriga, ou do focinho gelado encostado no meu nariz, cabeça com cabeça, só pra dizer que me amava.
Sou aquela que sempre escreveu, que vendia poemas e desenhos no recreio, e ganhava uma bela coleção de figurinhas raras por isso. Era viciada em Popeye, Pogobol e em tudo da década de oitenta. Brinquei de boneca até os onze, doze anos, porque naquela época ainda se brincava de boneca com essa idade.
Algumas peculiaridades sobre mim… toquei piano por quatro anos, joguei vôlei por seis anos. Falava armênio quando criança, aprendi inglês quase que sozinha. Também adoro cantar alto segurando um controle remoto ou uma colher de pau, enquanto faço passos de salsa ou axé. Cozinhar, eu cozinho sambando. E cozinho bem.
Sou apaixonada por Clarice Lispector, Vinícius de Moraes, Fernando Pessoa e Machado de Assis. Mas também sou fã de Funk como le gusta, Bob Marley e um bom e velho sambinha. Sou eclética, mas não sou surda. Sei o que é boa música. E se não for boa, mas o corpinho quiser mexer, então também tá valendo.
Acreditei em muitas coisas na minha vida, em duendes, em fadas, em anjos, em Fernando Collor, em Rio 92. Hoje acredito em mim mesma e no que eu posso fazer pelo mundo. E acredito em Deus. E na energia do universo. O universo sempre conspira para seja lá qual for o seu desejo.
O melhor lugar do mundo pra mim é onde eu possa colocar o pé na areia e sentir o salgado do mar. E se for no Brasil, melhor ainda. O Brasileiro não dá valor ao Brasil até o dia em tem que viver longe dele…
Larguei tudo por um grande amor. E como disse desde o começo, prefiro SEMPRE me arrepender do que fiz ao que deixei de fazer. Moro do outro lado do mar, se você olhar bem quando estiver na praia, não se preocupe, não vai me ver mesmo porque sou baixinha, lembra? Mas eu tô aqui, na terra de uma tal de Dona Beth. Uma terra fria, cinza, escura, mas que fica linda na primavera e no outono. Linda demais.
Eu sou um turbilhão de emoções, choro com propaganda de caridade para os burros do deserto, com abuso de animais e crianças. E se tiver em TPM, choro até em programa de calouros. Aliás, pensando bem, eu choro bastante. Sou transparente e emotiva, mas não sou fraca. Sou pequena, mas luto até a última gota pelos meus ideais e pelo que eu acho que vai ser bom pra mim. Afinal de contas, na minha vida eu sou a protagonista, e não uma mera figurante.
Eu sou feliz a cada dia, e tento aprender com os problemas da vida. Tento, principalmente, ter menos problemas imaginários. E os problemas reais, estou trabalhando para não despejar muita energia.
O que me faz feliz? Um lindo dia de sol. Canto de passarinhos, uma praia, uma borboleta azul ou amarela. Vida selvagem, um esquilo no jardim, ou parar o carro para dar passagem para uma família de patos ou coelhos. Isso me faz sentir viva. Dois cervos cruzando a estrada, e aquele susto de que ainda há vida nesse mundo que não é a humana. Ainda há Deus. E Deus eu sinto quando estou ao ar livre, quando sinto o vento no rosto ou olho para o céu. Há tanta coisa nesse mundo que vai além da nossa “vã filosofia”.
E eu acredito em energia, em alegria, em escolhas.  E sei que sou eu quem escolhe se  meu dia vai ser bom ou ruim, porque tudo depende do meu humor. E eu escolho ser feliz.
Sou uma pessoa eternamente dividida pela minha família e meu país de um lado do Atlântico, e o grande amor da minha vida do outro. Se eu tenho certeza de que fiz a coisa certa? Não. Acho que nunca terei essa certeza. Mas sei que quando ele me puxa pro seu colo e diz que tudo vai ficar bem, meu coração se acalma um pouco mais e, pelo menos por um segundo, eu tenho certeza. De que sou verdadeiramente amada dos dois lados do mar.

Quase igual

E faz exatamente três horas que eu acordei, sem contar as duas horas antes que eu levantei pra fazer xixi. E a chuvinha cai na mesma intensidade de cinco horas atrás, como se a nuvem do Cascão estivesse parada em cima de Reading. É uma daquelas garoas que molham… não como as de Paris que mais parecem uma brisa no rosto. É fina e molha. Como as de São Paulo.

Mudaram as estações

É um misto de amor e desgosto esse meu sentimento pela Inglaterra. Faz um dia bonito e eu amo até o inglês carregado  da BBC, faz dia feio e eu xingo até Henrique oitavo.
Mas nem tudo depende do sol, vocês sabem que meu humor é totalmente influenciável pela luz solar, então seria injusto julgar a ilha de acordo com o meu humor.
A Inglaterra é linda na primavera. Linda de perder o fôlego, aliás, se perde o fôlego quando passam aquelas bumble bees, abelhas peludas, gigantescas e extremamente barulhentas, voando pela sua cabeça. Isso sim é de perder o fôlego. E as flores, ah as flores. Cada uma com sua cor mais inimaginável, um formato indefinido, como as bluebells. Procura no google, elas são obras divinas essas bluebells. As berries também. É cerejeira carregada de cereja, amora preta pra tudo quanto é lado, blueberry, cranberry, strawberry… tudo quanto é berry! O último, o morango, chega a ficar de um tamanho que você jura que teve modificação genética.
Passear pelo interior da Inglaterra na primavera é divino. Nunca na tua vida verá cores como as daqui, principalmente o tom de verde das plantas, que tudo tem a ver com o grau de incidência do sol. Também no outono é a coisa mais linda do mundo. As folhas começam a secar nas árvores, de fora pra dentro. Ficam com uma borda amarela, o centro vermelho e a parte presa ao tronco ainda verde. É um milagre.
Caem tantas folhas no chão no outono que eu fico me perguntando o que acontecem com elas depois. Já faz semanas que por onde eu passo meu pé afunda em infinitos edredons de folhas secas. Que eu só odeio quando chove, porque aí fica uma nojeira só. Fiquei pensando esses dias “quem limpa essas folhas, porque elas não estão aqui no inverno!”. Sim, na grama elas viram adubo. No concreto eu já não sei.
Até que chega o inverno. As árvores pelam por inteiro, ficam só os troncos. Os bichos hibernam, meus esquilos somem, os pássaros somem, ficam só os corvos e a má fama deles. E tudo parece morto, sem vida, cinza, branco. O céu é sempre branco no inverno. E quando neva é lindo, se nevar só um pouco e você estiver dentro de casa.
Se te pegar desprevinido, abra o guarda chuva, porque essa eu já aprendi: neve molha. E molha bem. E queima também se quiser dar uma de brasileiro desavisado e fazer guerra de snow ball. Tudo bem, mas não tire a luva. Essa eu também aprendi da pior maneira.
E com o inverno vem a mais odiada das manifestações: o sol também hiberna. Por isso que eu odeio o inverno daqui. Eu gosto de frio é de São Paulo, que se resolve com uma bela taça de vinho, um casaco elegante e um foundue. Ou então com uma fogueira de festa junina. Inverno daqui não se resolve com nada.
E aí começa a palhaçada. Agora é Novembro e sete horas da manhã é que começa a clarear. E quando anoitece e você acha que são sete da noite, olha no relógio e são quatro e meia. Dá sono, dá tédio, dá dor no coração. É a saudades que o sol gosta de deixar. Ou pelo menos a claridade…
E ainda que nem chegou o inverno todo, as árvores nem se pelaram e os esquilos estão frenéticos escondendo todos os amendoins que eu joguei no jardim. No inverno mesmo, coisa de Fevereiro, a coisa fica preta. Literalmente. Claridade só entre oito e pouco da manhã e três da tarde. E já tá bom, e agradece aos orixás por não ser polo norte.
E eu que ansiava Fevereiro por causa de carnaval, agora penso… ah meu Deus, Fevereiro.
Um dia hei de ser muito rica e desfrutarei apenas das estações que eu gosto nos lugares que eu gosto. Em Dezembro embarcaria para o Brasil e ficaria por lá até Março, torrando no sol de alguma praia do litoral. Depois voltaria em Abril para a primavera inglesa. Em Julho trocaria facilmente o verão tolo daqui pelo inverninho gostoso de Campos de Jordão, e voltaria para o Outono. E em Novembro, cantaria de novo “Dois de Fevereiro, é dia de Iemanjá, levo ao dia oferendas, para lhe ofertar!!”
E passaria o Reveillon vestida de branco, na praia, todo mundo junto. E não encapotada de casaco.